Artigo, Francisco Ferraz - O preço da negação da derrota

     Os breves discursos, que antecediam a declaração de voto dos deputados favoráveis à aprovação da admissibilidade do processo do impeachment da presidente Dilma foram acerbamente criticados, pelas homenagens e agradecimentos feitos à família, aos eleitores e ao respectivo estado, numa oratória que pareceu muito pobre e sem imaginação, para uso em um momento especial da política e história do país.
     É verdadeira a crítica. Mas é igualmente verdadeira a crítica (que não foi feita) aos discursos contrários ao impeachment, que desfiou a mesma “litania do golpe”, do primeiro ao último deputado, numa repetição igualmente sem imaginação e, em várias ocasiões, intensamente raivosa.
     Os discursos favoráveis ao impeachment não nos devem surpreender por sua baixa qualidade. Estavam bafejados pela antecipação da vitória. Não foram pronunciados para nos fazer pensar...
     Já dos discursos contrários ao impeachment podia-se esperar mais. Qual a razão para os deputados repetirem a mesma ladainha que Dilma pronunciava nas reuniões que patrocinava no palácio; a mesma de Lula nos comícios e reuniões; a mesma das entrevistas dos ministros da casa.
     O script dos discursos era o mesmo porque não fora concebido para expressar uma linha estratégica, ele era um desabafo.
     Acostumado a demonizar os outros, viciado em ver sua vontade sempre atendida, convicto de que todos os brasileiros lhes devem muito, decidido a não reconhecer erros, não exibir nunca a boa e sincera humildade, o “PT do poder” revelou uma grave deficiência política: não sabe mais como lidar com a derrota.
     Refiro-me ao “PT do poder”para distingui-lo do “PT histórico”. Este sabia perder, reconhecer a derrota, buscar entendê-la e orientar estrategicamente o comportamento dos seus militantes e lideranças, levando em consideraçãosuas lições. Se não soubesse perder (e aprender com a derrota) não teria crescido e chegado aonde chegou.
     O PT de Lula e Dilma, ao contrário não consegue aceitar a derrota e reage a ela com uma descarga emocional completamente atípica para um partido de esquerda, cujos líderes e militantes são treinados para encarar a dinâmica política de forma impessoal.
     De fato, nem os partidos tradicionais se permitem reações emocionais tão desproporcionadas, sobretudo de suas lideranças.
     A busca de aprovação para a versão do impeachment de Lula, Dilma e o “PT do poder” é tão sofregamente procurada que, não sendo aceita no país é preciso busca-la no exterior.
     Somos então obrigados a ver com constrangimento uma presidente que vai buscar apoio político no exterior, em entrevistas com jornalistas estrangeiros e, segundo se diz, em viagem aos EUA, para denunciar o processo de impeachment como golpe, embora este processo tenha seguidoos passos processuais rigorosamente prescritos pela legislação existente e com o controle do Supremo Tribunal Federal.
     Se efetivamente a presidente se prestar a este papel, usando sua posição única para denegrir as instituições democráticas do Brasil, com o objetivo exclusivo de manter o poder, estará arrancando seus últimos fiapos de legitimidade.
    


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